07 abril, 2005

Viagens: Cusco, de umbigo do mundo a centro de turismo internacional


Cusco, antiga capital do império Inca, chamada pelos indígenas de “umbigo do mundo”, pode ser vista hoje como uma síntese da ocupação humana na região, congregando traços dos incas e dos conquistadores espanhóis ao modo de vida atual. A imponente Plaza de Armas, construída em estilo espanhol sobre antigas edificações incas está totalmente voltada para o turismo, tomada por cafés, restaurantes e lojas de suvenires. O comércio turístico se derrama pelas demais ruas do centro histórico, apinhadas de hotéis e pousadas montados em antigas casas coloniais.
O que mais atrai turistas a Cusco é a possibilidade de conhecer Machu Picchu, aonde se chega de trem, numa fantástica viagem de quatro horas atravessando paisagens maravilhosas. O trem sai todos os dias de Cusco, lotado de turistas americanos, alemães, italianos, franceses, israelenses.

O ponto final é Águas Calientes, às margens do rio Urubamba, onde se toma um microônibus para vencer os 600 metros verticais de subida até a misteriosa cidade de pedra. Lá em cima, no topo dos montes de encostas abruptas e por muito tempo quase inacessíveis, a impressão é indescritível.Os espanhóis não deixaram registro de que tenham conhecido Machu Picchu. A cidade permanceu escondida até ser encontrada pelo explorador americano Hiram Bigham, em 1911. São muitas as teorias sobre a função da cidade – universidade da elite inca, lar de sacerdotisas dedicadas a domesticar plantas alimentícias, medicinais e mágicas – mas a verdade permanece encerrada entre as paredes de pedra e os terraços gramados espalhados sobre morros cercados de paredões magníficos.



A tese sobre as sacerdotisas botânicas ganha força quando se conhece um pouco mais das tradições dos povos andinos. Entre elas está a fitolatria, a adoração das plantas, que tem um sentido mágico na vida das pessoas. Quem me falou sobre a relação do andino com a natureza foi a Doutora Rosa Urrunaga, etnobotânica e presidente do Instituto de Medicina Tradicional. Apaixonada pelo assunto, ela me levou até o mercado de Cusco, onde conheci diversas plantas mágicas, como os winkikis, que servem para atrair a pessoa desejada, as folhas de coca bipartidas, que dão sorte e as tripartidas, que servem para causar o mal.

Na adoração do andino pelas plantas, a folha de coca ocupa um lugar especial. Ela é usada para ler o passado, o presente e o futuro e é o principal ingrediente do samincha, também conhecido como despacho ou pago a la tierra, ritual dedicado a natureza que serve para buscar o equilíbrio com o ambiente, muito importante numa região de recursos escassos como os Andes. É bom ressaltar que a medicina tradicional andina se ocupa não só dos males do corpo, mas também da alma.

E o despacho também pode ser usado para pedir que uma empreitada – como esta viagem – dê certo. Foi o que fizemos. Doutora Rosa me apresentou a curandeira Ch’aska Kuka K’inthu, especializada em medicina natural. Fomos com ela até o povoado de Tipon, subimos um monte até avistar o cume do Pachatusan – pico nevado que domina a paisagem de Cusco – e realizamos o nosso pago a la Pachamama. (agosto 2001)

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